Rossio ao Sul do Tejo, a minha aldeia.
Passados dois anos do meu nascimento mudámos de casa. Deixámos a casa verde e passámos para uma casa na Rua das Comissões. Poucas centenas de metros distam uma da outra. Nunca mais voltei à casa verde (que ainda hoje é verde) e os meus país nunca mais voltaram a mudar de casa. Durante a minha infância dividia-me, de Setembro a Maio, entre a casa dos meus pais, a casa dos meus avós, que ficava junto ao Largo da Igreja, e a escola primária. De Junho a Agosto, era entre a casa dos meus pais, a casa dos meu avós e o velhinho ringue do Rossio (sem contar com as 3 semanas que, religiosamente, passávamos em Monte Gordo). Nem sei bem que idade tinha quando tive a minha primeira consola de jogos e sei que quando recebi o meu primeiro telemóvel já tinha bigode. Mas isso pouco interessava naquele tempo. No Verão, era manhã livre para umas voltas de bicicleta, ou junto ao Tejo ou para os lados do pinhal, e à tarde, bem, à tarde era sagrado, jogar à bola no ringue até ser noite. Ainda consigo recuar no tempo e sentir os quentes finais de tarde daqueles dias. Ia sempre de bicicleta. Sempre pela marginal do Tejo. O Tejo ainda não estava na versão Aquapolis, muitas vezes, quando já era noite, conseguia ser assustador. Seguia pela marginal, entrava numa zona de quintais, depois virava para o Largo Peralvo, aí tinha de acelerar para fugir de uns cães que lá existiam, depois entrava na Rua da Fundição, nunca olhava para a azinhaga que ia dar à Fonte dos Touros, era assustador para mim, e depois, finalmente, casa. Muitas vezes, voltava pelo mesmo caminho, já noite e depois de jantar, quando existiam torneios de futebol de salão. Muitas vezes para jogar, quando existiam escalões para os mais jovens (joguei o meu primeiro torneio ali, devia ter uns 7/8 anos), e muitas outras para ver os mais velhos a jogar. Tudo isto, e mais três ou quatro coisas, daquelas bem simples, faziam da minha terra um paraíso para mim. Ia a Lisboa, ia ao Algarve, ia a outros lugares. Gostava. Mas não me podia demorar muito, porque a minha casa era outra. Nunca desejei ser de outro lugar. Não me lembro de passar um dia triste na minha infância. Certamente tive dias menos bons. Mas não me recordo. Mas na face oposta, tenho mil memórias boas. Acho que este é um bom principio para assumir que tudo correu bem. Devo isso à minha terra e às suas pessoas (é claro, em especial aos meus pais e aos meus avós).
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Esta história pertence ao projeto Retratos do Centro de Portugal. Vão ser construídos 365 retratos, 365 pequenas histórias, sobre toda a grande Região Centro de Portugal. Podem consultar todos os retratos aqui.