Castelo Branco
A minha primeira recordação sobre Castelo Branco perde-se no meu tempo. Foi precoce, improvável e intensa. De tal maneira intensa que, ainda hoje ao me cruzar com Castelo Branco, a recordo com o misticismo e ingenuidade de uma criança. Vivi a minha infância em Rossio ao Sul do Tejo, freguesia do concelho de Abrantes. Num dos principais cruzamentos da minha terra, existia uma placa, virada a Este, que dizia: “Castelo Branco – 104”. 104 eram os quilómetros que separavam os dois pontos, a minha terra e Castelo Branco. Sim, ainda me recordo do número. Tantas e tantas vezes me cruzei com aquela placa, quase tantas com aquelas que imaginei um castelo branco. Sim, durante alguns anos imaginei que algures existia um castelo branco, não só de nome, mas de cor branca. Acredito que nunca tenha partilhado este acontecimento fértil da minha imaginação, talvez esta viagem de fantasia tivesse terminado mais cedo do que terminou. É tão bom ter lugares fantásticos.
Anos mais tarde, recordo-me de, a caminho da Serra da Estrela, ter passado por Castelo Branco. Já desconfiava que não iria existir nenhum castelo branco, pintado talvez pela neve. Mas ao passar por lá, mesmo sem ver qualquer castelo, imaginei um, branco. E, de certa forma, ainda acontece hoje. Imaginar um castelo branco, no alto de um monte, por onde circulavam cavaleiros e seres especiais. Por culpa de uma simples placa e de um nome com uma associação particular, guardo, ainda hoje, esta cidade num lugar especial e vejo-a sempre com o carinho de quem gosta.
Passada esta viagem pelo fantástico, recentemente visitei Castelo Branco. Melhor do que visitar, vivi Castelo Branco.
Não sei se pela minha relação passada com Castelo Branco, se por achar em convicção que as viagens em territórios devem começar no seu ponto mais alto. Talvez para conseguir ter uma perspectiva inicial sobre todo o território, talvez por, de uma forma geral, o ponto mais alto se confundir com algo importante. Os nossos antepassados e fundadores de cidades sabiam o que faziam. Pois bem, no ponto mais alto da cidade está o castelo, ou o que resta dele. Foi aqui que a minha viagem por Castelo Branco começou.
Estava um dia bonito de início de Outono. O calor do Verão já tinha passado, o frio do Inverno ainda não tinha chegado e aquelas cores quentes da vegetação já se faziam notar. O castelo foi erguido em 1209 pelos Templários. Juntamente com outros castelos, como, por exemplo, o vizinho Castelo de Monsanto, faziam parte da linha de defesa do Tejo. Hoje, o castelo está parcialmente destruído, mas suficientemente presente para se perceber a sua importância e justificar a sua posição de primeiro lugar de visita. A vista para o grande núcleo urbano da cidade é incrível e encorajadora para o que vem aí. Depois de sentir o aroma da cidade lá bem no alto, comecei a descer pelas ruas adjacentes ao castelo como quem sobe ao alto de um escorrega de um parque aquático e entra em diversos cursos de água a toda a velocidade. Estava no coração do centro histórico de Castelo Branco. Ruas estreitas, traço antigo, troço empedrado, casas pequenas, roupa estendida na rua como manda a tradição e conversas de algibeira, que exigem mais do que um simples “bom dia”. Uma das minhas conversas de algibeira foi com a querida menina Rosário. Do alto da sua composta idade, só me pediu para não ser tratada por dona, menina estava bom para ela. A menina Rosário, vive no centro histórico de Castelo Branco, sempre lá viveu e não gosta de sair de lá. Parece-me romântico conhecer o mundo, mas também me parece romântico ser genuinamente fiel a um só lugar. A menina Rosário estava numa pequena praça, perto de sua casa. Já tinha ido à missa e já tinha feito os seus afazeres da manhã. Estava, simplesmente a ver a vida passar e alimentar o seu corpo com o bonito sol que brilhava naquela manhã. Depois do “bom dia”, a menina lá me contou como era a sua vida por ali. Simples, onde a simplicidade perfeita se parece aplicar. Trata por tu todas as flores do seu bairro, conhece todos os seus vizinhos, que lamentavelmente já não são muitos, e sabe a história de todas as casas que confluem com as da sua rua. Quem lá viveu e porque deixou de lá viver. Contou tudo, como o melhor dos guias certificados não conseguiria contar. Levou-me sorrisos e o desejo de mais conversas guiadas como esta. Nenhum centro histórico estará morto enquanto lá viverem pessoas como a encantadora menina Rosário.
Depois da despedida da menina Rosário lá continuei a minha jornada pela cidade. Sem sair do seu pedaço mais histórico fiz uma viagem plural pela criatividade albicastrense, em modo intemporal, saltitando entre diferentes épocas. De uma forma genuína e palpável defini a criatividade desta terra em três movimentos artísticos e visitáveis. O passado e tradição com o Centro de Interpretação do Bordado, onde simpáticas senhoras honram a memória, talvez, das suas avós, fazendo com que a chama do bordado permaneça acesa. O presente com a contemporaneidade do Museu Cargaleiro a iluminar as nossas mentes, com o património genial da genialidade do Mestre Manuel Cargaleiro. E o futuro com a Fábrica da Criatividade, uma antiga e devoluta fábrica de confecções deu lugar a espaço de criação, no seu estado mais puro, onde se torna fácil sonhar. Confesso que nesta viagem entre diferentes épocas e artes, os meus olhos brilharam com muita intensidade na Fábrica da Criatividade. Um espaço incrível, com oficinas equipadas para diferentes artes, como fotografia, video, madeiras, cerâmicas, metais, serigrafia, têxtil e mais umas quantas, onde tudo parece fluir à velocidade da criatividade. Um espaço do futuro no presente.
A minha viagem por Castelo Branco continuou em formato de vivência. Pelos meus olhos passaram vários rostos e rotinas. Rotinas de mães com os seu filhos, de pessoas acabadas de sair do seu trabalho ou de simples conversas entre amigos. Talvez seja esta genialidade banal que seja a maior graça de uma cidade e Castelo Branco não foge a esta espécie de regra. O dia já caminhava para o seu final, e como sabem bem os finais de tarde de Outono para os lados da província raiana da Beira Baixa. Com um copo de vinho tinto na mão voltei a pensar no castelo branco. Talvez a sua cor não seja branca, mas o carinho por este lugar justifica-se.
A minha primeira recordação sobre Castelo Branco perde-se no meu tempo. Foi precoce, improvável e intensa. De tal maneira intensa que, ainda hoje ao me cruzar com Castelo Branco, a recordo com o misticismo e ingenuidade de uma criança. Vivi a minha infância em Rossio ao Sul do Tejo, freguesia do concelho de Abrantes. Num dos principais cruzamentos da minha terra, existia uma placa, virada a Este, que dizia: “Castelo Branco – 104”. 104 eram os quilómetros que separavam os dois pontos, a minha terra e Castelo Branco. Sim, ainda me recordo do número. Tantas e tantas vezes me cruzei com aquela placa, quase tantas com aquelas que imaginei um castelo branco. Sim, durante alguns anos imaginei que algures existia um castelo branco, não só de nome, mas de cor branca. Acredito que nunca tenha partilhado este acontecimento fértil da minha imaginação, talvez esta viagem de fantasia tivesse terminado mais cedo do que terminou. É tão bom ter lugares fantásticos.
Anos mais tarde, recordo-me de, a caminho da Serra da Estrela, ter passado por Castelo Branco. Já desconfiava que não iria existir nenhum castelo branco, pintado talvez pela neve. Mas ao passar por lá, mesmo sem ver qualquer castelo, imaginei um, branco. E, de certa forma, ainda acontece hoje. Imaginar um castelo branco, no alto de um monte, por onde circulavam cavaleiros e seres especiais. Por culpa de uma simples placa e de um nome com uma associação particular, guardo, ainda hoje, esta cidade num lugar especial e vejo-a sempre com o carinho de quem gosta.
Passada esta viagem pelo fantástico, recentemente visitei Castelo Branco. Melhor do que visitar, vivi Castelo Branco.
Não sei se pela minha relação passada com Castelo Branco, se por achar em convicção que as viagens em territórios devem começar no seu ponto mais alto. Talvez para conseguir ter uma perspectiva inicial sobre todo o território, talvez por, de uma forma geral, o ponto mais alto se confundir com algo importante. Os nossos antepassados e fundadores de cidades sabiam o que faziam. Pois bem, no ponto mais alto da cidade está o castelo, ou o que resta dele. Foi aqui que a minha viagem por Castelo Branco começou.
Estava um dia bonito de início de Outono. O calor do Verão já tinha passado, o frio do Inverno ainda não tinha chegado e aquelas cores quentes da vegetação já se faziam notar. O castelo foi erguido em 1209 pelos Templários. Juntamente com outros castelos, como, por exemplo, o vizinho Castelo de Monsanto, faziam parte da linha de defesa do Tejo. Hoje, o castelo está parcialmente destruído, mas suficientemente presente para se perceber a sua importância e justificar a sua posição de primeiro lugar de visita. A vista para o grande núcleo urbano da cidade é incrível e encorajadora para o que vem aí. Depois de sentir o aroma da cidade lá bem no alto, comecei a descer pelas ruas adjacentes ao castelo como quem sobe ao alto de um escorrega de um parque aquático e entra em diversos cursos de água a toda a velocidade. Estava no coração do centro histórico de Castelo Branco. Ruas estreitas, traço antigo, troço empedrado, casas pequenas, roupa estendida na rua como manda a tradição e conversas de algibeira, que exigem mais do que um simples “bom dia”. Uma das minhas conversas de algibeira foi com a querida menina Rosário. Do alto da sua composta idade, só me pediu para não ser tratada por dona, menina estava bom para ela. A menina Rosário, vive no centro histórico de Castelo Branco, sempre lá viveu e não gosta de sair de lá. Parece-me romântico conhecer o mundo, mas também me parece romântico ser genuinamente fiel a um só lugar. A menina Rosário estava numa pequena praça, perto de sua casa. Já tinha ido à missa e já tinha feito os seus afazeres da manhã. Estava, simplesmente a ver a vida passar e alimentar o seu corpo com o bonito sol que brilhava naquela manhã. Depois do “bom dia”, a menina lá me contou como era a sua vida por ali. Simples, onde a simplicidade perfeita se parece aplicar. Trata por tu todas as flores do seu bairro, conhece todos os seus vizinhos, que lamentavelmente já não são muitos, e sabe a história de todas as casas que confluem com as da sua rua. Quem lá viveu e porque deixou de lá viver. Contou tudo, como o melhor dos guias certificados não conseguiria contar. Levou-me sorrisos e o desejo de mais conversas guiadas como esta. Nenhum centro histórico estará morto enquanto lá viverem pessoas como a encantadora menina Rosário.
Depois da despedida da menina Rosário lá continuei a minha jornada pela cidade. Sem sair do seu pedaço mais histórico fiz uma viagem plural pela criatividade albicastrense, em modo intemporal, saltitando entre diferentes épocas. De uma forma genuína e palpável defini a criatividade desta terra em três movimentos artísticos e visitáveis. O passado e tradição com o Centro de Interpretação do Bordado, onde simpáticas senhoras honram a memória, talvez, das suas avós, fazendo com que a chama do bordado permaneça acesa. O presente com a contemporaneidade do Museu Cargaleiro a iluminar as nossas mentes, com o património genial da genialidade do Mestre Manuel Cargaleiro. E o futuro com a Fábrica da Criatividade, uma antiga e devoluta fábrica de confecções deu lugar a espaço de criação, no seu estado mais puro, onde se torna fácil sonhar. Confesso que nesta viagem entre diferentes épocas e artes, os meus olhos brilharam com muita intensidade na Fábrica da Criatividade. Um espaço incrível, com oficinas equipadas para diferentes artes, como fotografia, video, madeiras, cerâmicas, metais, serigrafia, têxtil e mais umas quantas, onde tudo parece fluir à velocidade da criatividade. Um espaço do futuro no presente.
A minha viagem por Castelo Branco continuou em formato de vivência. Pelos meus olhos passaram vários rostos e rotinas. Rotinas de mães com os seu filhos, de pessoas acabadas de sair do seu trabalho ou de simples conversas entre amigos. Talvez seja esta genialidade banal que seja a maior graça de uma cidade e Castelo Branco não foge a esta espécie de regra. O dia já caminhava para o seu final, e como sabem bem os finais de tarde de Outono para os lados da província raiana da Beira Baixa. Com um copo de vinho tinto na mão voltei a pensar no castelo branco. Talvez a sua cor não seja branca, mas o carinho por este lugar justifica-se.