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rio tejo – mais do que um rio

Talvez, em 1989, seja a minha primeira grande recordação que tenho do rio Tejo. No inicio de Inverno, tinha 5 anos acabados de fazer, tinha acabado de entrar para a escola primária da minha terra, Rossio ao Sul do Tejo. Sim, o nome diz tudo. É uma freguesia do concelho de Abrantes, delicadamente plantada a Sul do rio Tejo. Abrantes, cidade, forma a encosta Norte, depois o Tejo, e na planície a Sul, a minha aldeia, que outrora foi um dos mais importantes portos de interior (de rio), talvez, da Europa. Ficava (o porto e a aldeia) bem no centro de um país que tentava descobrir o Mundo e por ela passava um rio (o meu Tejo) que ligava Madrid a Lisboa, ou seja, as capitais de dois poderosos impérios. Isto numa altura em que não existiam carros, auto-estradas, comboios ou aviões. Dá para perceber a importância, não dá? Desculpem, esta pequena introdução, movida pelo orgulho, mas achei necessária. Voltando ao Inverno de 1989. Inverno de muita chuva e o Tejo saiu do seu caminho. Galgou terreno e inundou a minha aldeia. Apesar da aparente desgraça, e de ter ficado desalojado por uns dias (fui com os meus pais para casa dos avós paternos), as memórias até são boas. Recordo-me de toda a família estar reunida, como uma espécie de Natal antecipado, e recordo-me, sobretudo, de ver algumas das ruas da minha aldeia com barcos a circularem, em vez dos habituais carros. Ao melhor estilo de Veneza. Achei engraçado. Na altura não sabia que existia Veneza, e hoje que sei, talvez não achasse piada a ver barcos a circular pelas ruas do Rossio. Felizmente ninguém se aleijou, por isso, acredito eu, muitos dos meus conterrâneos, até recordem com algum saudosismo este tempo de cheias do Tejo. Mesmo com as condicionantes da altura, ter que tirar tudo de casa ou ver água lamacenta a entrar pela sua porta. Não é que quisessem que o Tejo voltasse a entrar pelas suas ruas e casas, talvez o saudosismo seja do tempo, como muitos ainda dizem: “em que Tejo era Tejo”.

Passada essa primeira memória, muitas outras se seguiram. Muitas brincadeiras junto ao rio, muitos passeios de canoa, muitas histórias contadas pelos familiares e amigos mais velhos. Desde a saudosa caça ao pato (o pato era lançado na água e a malta tinha de o apanhar a nado, talvez por isso, ainda hoje, as pessoas do Rossio são conhecidas como “Patos Bravos”), a mergulhos na ponte ou travessias de barco. Com sinceridade, sinto o Tejo como se fosse um amigo muito próximo. Não é preciso vê-lo todos os dias, não é preciso falar dele todos os dias, sabemos que ele lá está e que faz parte, inequivocamente, das nossas vidas. Sinto o Tejo assim.

2019

Esta história pertence ao projeto Retratos do Centro de Portugal. 365 retratos, 365 pequenas histórias, sobre o que faz da região Centro de Portugal um lugar diferente. Podem consultar todos os retratos aqui.

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