Hotel Segredos de Vale Manso. O nome do hotel enquadra-se bem no contexto.É um segredo digno de uma descoberta. Com GPS facilmente se chega lá, mas, romântico e clássico como sou, acredito que o acesso e descoberta do mesmo apenas deveria ser feita com mapa, com um mapa de pano rascunhado à mão. Sim, ao estilo de mapa do tesouro. 

Vou começar pela localização. Fica no concelho de Abrantes, bem perto das aldeias de Martinchel, Aldeia do Mato e Carreira do Mato. Até aqui, diria que tudo normal. Agora a parte especial, o hotel fica localizado numa das encostas norte da albufeira de Castelo de Bode, talvez com uma das mais privilegiadas vistas para a mesma. A este lado especial, ainda podemos juntar o contraste lindíssimo verde/floresta-azul/lago, e o facto feliz de a majestosa Grande Rota do Zêzere passar à sua porta e estar dois paços de distância de três bonitas praias fluviais: Aldeia do Mato, Fontes e Penedo Furado. Ainda posso mencionar, no sentido especial, da proximidade das cidades históricas de Abrantes, Constância e Tomar, promovendo também o contraste cultura/património-natureza/tranquilidade. Já vos parece um tesouro?

Apesar de toda imponência que este lugar e o hotel apresentam, tudo é muito genuíno e natural por aqui. Diria mesmo que familiar. Por isso, tenho de referir e incluir na história, a dona do hotel, a super simpática Isabel Coimbra. Recordo com grande empatia uma das primeiras frases que disse, nas nossas primeiras conversas no hotel: “bem-vindo à minha casa grande”. Talvez isto seja uma espécie spoiler, anunciando já o final da história. Chegar ao Vale Manso (sim, ao hotel), é isto mesmo, chegar a casa (uma bem grande) da Isabel. Com todas as coisas boas que podemos absorver quando chegamos a casa de alguém que nos quer bem e nos vai receber bem. Aconteceu comigo, com tanto impacto, que já faço da casa (grande) da Isabel também a minha casa. Quase como visitamos a casa daquele tio divertido (e de quem gostamos muito) no Natal. Esta casa (grande) tem mais umas vantagens, além daquele bom conforto familiar. Tem uma vista e envolvência quase inigualáveis. Ah, também um restaurante com comida que pode fazer inveja aos petiscos da nossa tia.

Um vez chegados ao hotel tem duas hipóteses de “modo vida”. Um saboroso dolce fare niente, deambulando pelos bonitos jardins do hotel, um mergulho na piscina, um livro com vista para a albufeira, um almoço prolongado no restaurante e até podemos incluir um ligeiro passeio pela floresta adjacente, onde o ar puro é digno de ser respirado. Bem, nesta arte, somos todos especialistas, e o hotel perfeito para a boa prática da mesma. O outro “modo de vida”, é quem tem bichos carpinteiros e não consegue estar mais que um dia numa espreguiçadeira, mesmo com a vista mais bonita do mundo. A este “modo de vida”, eu chamo de exploradores. Como, neste modo de estar, nem todos são especialistas e já é preciso mapa, eu dou uma ajuda e faço um roteiro para explorar as redondezas. Neste caso, um roteiro de dois dias pelo concelho de Abrantes. Poderia dar-vos outras opções. Mas vocês já sabem, Abrantes é a minha terra e o meu tesouro, conheço todos os seus segredos. O roteiro, a começar no hotel:

 

|dia 1|

Apesar de ser uma espécie de roteiro (são só dois dias), o primeiro ponto a ser visitado vai ser um dos ponto mais alto do concelho, como nos roteiros normais, para uma vista desafogada e para nos situarmos paisagisticamente. Fica a poucos minutos do hotel. Cristo Rei da Matagosa, é o lugar, uma espécie de “pequeno segredo” de Abrantes. Poucas são as pessoas do sul e centro do concelho que conhecem este lugar. Acredito que seja o ponto mais alto de todo o território (de Abrantes), que o transforma numa espécie de anfiteatro (ou miradouro) para a albufeira de Castelo de Bode e para as aldeias escondidas no meio da densa floresta. Demorem o tempo que quiserem a sentir a paisagem, vale a pena. Depois de descer do cume do Cristo Rei, é seguir viagem pelas bonitas aldeias junto à albufeira. Com o azul das águas a misturar-se com verde da floresta. As primeiras aldeias vão ser Matagosa e Água das Casas. Para mim, duas icônicas aldeias. Têm uma genuinidade que encanta e uma espécie de charme rural, assim ao estilo italiano, elevado pela paisagem arrebatadora que as envolve. Um ponto a terem muita atenção e cuidado, se fizerem esta viagem no Verão, poderão apanhar as “perigosas” festas anuais destas aldeias. Correm um sério risco de a viagem acabar aqui. É que as festas de Verão do Norte do concelho são tão giras, que podem não querer sair de lá e esquecer por completo tudo o resto. Então a festa de Água das Casas, é uma coisa extraordinária. 

Assim rápido, paragem no miradouro das Fontes e mergulho na Cabeça Gorda (isto de Verão é claro). Já está? Percebam a rapidez? É que ainda temos muito para ver. Todas as aldeias do Norte do concelho têm um encanto particular. Acredito que seja pelas águas da albufeira. Ou então pela simpatia da sua gente. Ou pela comida. Olhem não sei. Mas que é digno de ser vivido, é. Disse rápido? Esqueçam, vão devagar e demorem o tempo que precisarem. Existem aldeias por ali, explorem-nas. Explorem cada cantinho com vista para a albufeira. Muitas das aldeias nem chegam à centena de habitantes e todas têm nomes muito particulares. 

No final desta incursão pelo Norte, é tempo de visitar uma das pérolas. Aldeia do Mato. Muitas vezes digo, que se a Aldeia do Mato fosse “plantada” em Itália, já existiam postais com a “cara” da Aldeia do Mato à venda no aeroporto. Não, não acho que Itália seja melhor que Portugal. Apenas “descobriu” o turismo de pormenor primeiro. E pegando no exemplo de Itália, existe junto ao extremo Norte, uma espécie de ruralidade charmosa. Algo que os italianos vendem tão bem. Um identidade crua, construída por pessoas verdadeiras e trabalhadoras,  que se mistura com uma paisagem deslumbrante, quase cristalina (não só a água, tudo o resto é puro). Eu acho que será uma surpresa para muitos. É claro que uma visão deste charme italiano, nesta altura do campeonato, só está ao nível de um sonhador como eu. Mas, vamos ver se o tempo me dá razão e os vossos corações o conseguem sentir (os olhos verem é fácil).

Bem, o dia já deve de ir a mais de meio. É tempo de “descer” até à cidade. Começo a visita ao centro histórico da cidade de Abrantes no castelo. Fácil. Diz-se que foi ocupado por romanos, visigodos ou muçulmanos. Acredito ter muito em comum com alguns que a ocuparam, independentemente da crença ou religião, talvez tenham visto o mesmo que eu vejo hoje ao subir ao ponto mais alto da cidade. Com o passar entre diferentes mãos, com diferentes utilizações, foi sofrendo múltiplas renovações, adaptações e “desconstruções” (acabei de inventar esta palavra, para adjectivar o acto de quem se estava borrifando para o passado e para o valor da história…assim foi nos meados do século XX). Apenas há cerca de 20 anos estabilizou e possuí a imagem que tem hoje. O melhor do Castelo de Abrantes? (ou o que ver no Castelo de Abrantes?) Uma paisagem incrível, a perder de vista, onde o nosso olhar acaba com o horizonte (aqui, o olhar cruza-se sempre com o de um romano ou visigodo). Também possuí, para mim, a melhor vista para o centro urbano da cidade (dá-lhe um charme digno de Paris) e também, não digo a melhor, mas uma das posições mais privilegiadas para assistir ao pôr do sol na cidade. Adoro percorrer as diferentes plataformas das colunas do castelo, para conseguir o melhor ângulo. Todos os dias são diferentes. Parece que a cidade se move lentamente.

Abrantes (centro histórico) é uma espécie de planalto que termina no rio Tejo, com o ponto mais alto no castelo (onde já estivemos). Muitas vezes digo que o castelo, lá no alto, é a nascente desta cidade, com as suas ruas estreitas a serem cuidados canais, que alimentam as bonitas praças, que considero como ilhas. Podemos sair do castelo em direção à Igreja de São Vicente, virada para o clássico cine-teatro de São Pedro, ou seguir pela igreja de São João passando pelo, muito bonito, jardim do castelo. O jardim do castelo é um clássico de todos os abrantinos (pelo menos os nascidos em 80s e 70s), todas as sessões de fotografia dos casamentos passavam por ali. A moda passou e hoje é completamente demodé (o inverso de estar na moda) falar em casamentos e jardim do castelo ao mesmo tempo. Mas o jardim está mais bonito que nunca. Felizmente a cidade ainda não perdeu o seu lado genuíno, e que para muitos é provinciano, para mim é delicioso. Nesta viagem, mais do que passarem por lojas, cafés ou restaurantes, vão passar pela Drogaria Nova da Joana, que é da minha idade, arquitecta e que voltou à sua cidade para abrir (ou renovar a alma) da loja da família, vão passar pela loja de roupa de criança da Marta, que vos vai cumprimentar certamente com seu ar bem disposto, ou jantar ao restaurante Santa Isabel, do Alberto, um dos melhores da região (têm mesmo de ir), ou beber um café na esplanada do Chave d’Ouro do Filipe, ou comer um gelado (a sério, o melhor do Mundo) à gelataria Liz, herança do sr. Paulo Dias (sr. que marcou gerações), ou beber um cerveja ao clássico Tonho Paulos, para ver a velocidade do Miguel a servir às mesas. E podia dar mais uns 30 bons exemplos, do quão deliciosa e familiar esta cidade, e o seu centro histórico, podem ser. São estes pequenos (grandes) pormenores que fazem cidades gigantes, em personalidade. Já mencionado, mas volto a repetir. Acabem o dia com um jantar no Santa Isabel. São sentir Abrantes como a vossa casa.

| dia 2 |

Último dia em Abrantes? Já? Eu avisei que dois dias era muito pouco. Mas vamos continuar. É tempo de rumar a Sul, passar ponte sobre o rio Tejo e conhecer outro mundo. 

Começam por visitar a minha santa terra, Rossio ao Sul do Tejo. Devem ir rapidamente ao café Pato Bravo, com sorte encontram-me por lá. É uma espécie de sala de estar para mim. Cumprimentem o sr. António, mas não lhe falem no Sporting (pelo menos enquanto o Sporting não for campeão). Depois devem percorrer as ruas estreitas e sentir o Tejo, que dá nome a esta terra. Já estão no Tejo? Agora imaginem centenas de barcos a circularem por lá e gente desde Évora a Coimbra, a carregar e receber mercadorias. No passado foi assim, que fez do Rossio uma pequena metrópole. Que podem confirmar pelas imensas casas riquíssimas e brasonadas (hoje, grande parte, ao abandono) no seu centro histórico.

É tempo de seguir junto ao rio. Vamos seguir para o Tramagal. O Tramagal é dos lugares históricos do concelho. Muito por culpa da família Duarte Ferreira e da sua metalúrgica, com um passado industrial gigante e muito interessante. Existem histórias que facilmente davam um filme. A história de Eduardo Duarte Ferreira (e seus filhos) é um desses casos. Grande empreendedor e fundador da Metalúrgica Duarte Ferreira (MDF). Chegou a empregar cerca de 2500 trabalhadores, e ainda hoje a borboleta (símbolo e marca da MDF) ou a mítica Berliet Tramagal (camião montado na MDF), são vistos por esse Mundo fora. A MDF foi extinta em 1994, mas hoje, além do (imenso) legado, e de muitas histórias e memórias, também existe um museu, que promete eternizar a vida deste homem e de sua família. Museu, que aconselho a visitar. Do museu vão diretos para a vinha e adega do Casal da Coelheira.

Sobre o Casal da Coelheira, vou partilhar convosco uma história. Sou muito ligado à minha terra. Acho que todos sabem isso. Às vezes exagero. Dos exageros que me recordo, um dos maiores, ou talvez mesmo o maior, está ligado ao Casal da Coelheira.  Em 2016, visitei com a Liliana  a região da Toscânia, em Itália, consagrada como umas das mais importantes regiões de vinho do MUNDO. Estivemos alguns dias por lá, visitámos toda a região, com paisagens estrondosas de vinhas, provámos vários vinhos e visitámos várias quintas. Uma delas em particular, na sub-sub-região Chianti Clássico. Ou seja, se a sub-região do Chianti já é especial, a sub-sub-região do Chianti Clássico é uma espécie de meca dos vinhos. Nessa quinta, estava à nossa espera uma visita especial, à quinta, adega e prova de vinhos, que seria guiada tão somente por aquele que tinha sido considerado o sommelier do ano em Itália. Sim, estão a perceber bem. Era uma pessoa muito importante. Começamos a visita à vinha, e ele falou, falou, coisas interessantes, até nos deu um copo para provarmos um vinho feito a partir daquela casta que estava bem à nossa frente. Estávamos num sitio de filme e ter uma experiência de actor. Provei o vinho, que era belíssimo. E qual foi a minha primeira reação? Não foi “belíssimo” ou “que bela casta que aqui tem”, ou “sabe a amoras com ligeiro travo a amêndoa”. Enfim, conversas típicas de provas de vinho. Foi um…”e os vinhos do Casal da Coelheira? Conhece?” Mal esta expressão me saiu da boca, percebi a argolada que tinha acabada de cometer. Camuflada até, com uma certa dose de parolice. Mas foi genuíno. E acho que me saiu daquela forma porque não achei o vinho melhor que os vinhos do Casal da Coelheira, ou pelo menos não me soube melhor. É claro que o sommelier olhou para mim com aquela cara típica “mas que raio está este a dizer!?”. Quero acreditar que graças a isto, o Casal da Coelheira ainda hoje é falado na famosa sub-sub-região do Chianti Clássico. Na altura fiquei um bocadinho envergonhado, mas hoje recordo esta história com um sorriso carregado de orgulho. A adega do Casal da Coelheira é muito gira e pessoas muito simpáticas. Também a vinha, junto ao rio, vale a visita. E sim, têm de provar o vinho.

No centro do Tramagal, vão encontrar uma indicação para a aldeia das Bicas. É para aí que vão seguir. Começamos a entrar na imensidão do sul do concelho. O Tejo fica para trás, e a Lezíria também. Estamos a entrar na zona da Charneca Ribatejana. Um território que me toca no coração de uma forma muito especial. Primeiro conselho, abram o vidro do carro e desfrutem. Este percurso em concreto, é delicioso na Primavera. Os cheiros são incríveis. É território de muitas variedades florestais e grande campos abertos. Mais um contraste gigante em relação a tudo o que já foi visto.

Vão passar por Bicas, Vale de Açor e Bemposta. Tudo lugares de boa gente. Muitos amigos tenho por aqui. Na Bemposta, caso seja Domingo, têm de parar no campo da bola para assistir a um jogo da equipa local. Nada melhor que um jogo da Inatel para sentir as pessoas e para uma boa experiência. Esqueçam o futebol, estão ali para conviver. Os lugares perto do bar são os melhores. Depois da Bemposta, devem seguir na direção de Água Travessa. Sim, a aldeia da minha Liliana. Um lugar muito especial para mim. São pouco mais de 10km da Bemposta até lá. A meio do caminho já perceberam que vão chegar (ou que estão num lugar diferente) a um lugar diferente. Sobreiros, campos agrícolas e gado. Nem é Alentejo, nem é Ribatejo. É uma deliciosa mistura dos dois. Aqui termina o concelho de Abrantes. A Sul já estão a ver o Alentejo e a Oeste é concelho da Chamusca. Vão ver que as pessoas tem uma prenuncia diferente das do norte e do centro. Se ficarem mais um pouco, vão ver que a comida é diferente. As pessoas são igualmente boas.

É caso para dizer que um segredo nunca vem só. O Hotel Segredos do Vale Manso, não é só um hotel. É uma espécie de porta de entrada para descobrir diferentes mundos, diferentes segredos. Sobretudo, para cultivar boas memórias e originarão histórias ainda melhores. E esse não é maior retorno de uma viagem? Visitem este hotel e este lugar. Vale a pena.

 

 

Email: reservas@valemanso.com
Telefone: +351 241 105 809

Site: valemanso.com

Morada: Rua De Vale Manso
Albufeira de Castelo do Bode – 2200-601 Abrantes