vinho do pico

 

No livro Guerra e Paz, Tolstoi fala no vinho do Pico e talvez este evento literário, de uma magnitude difícil de quantificar, seja a prova cabal da sua importância. Mas se apesar disso, dúvidas restarem, pensemos no facto de terem sido frades franciscanos a liderar o plantio da vinha, e aí a questão torna-se sagrada. Existe uma dureza indissociável às vinhas na Ilha do Pico, onde todos os trabalhos envolvem a força das mãos. As vinhas do Pico são filhas da volubilidade do clima, da impetuosidade do mar, da negrura da lava e da própria rudeza da pedra, e é dessa poderosa amálgama, que se escreve a sua história. 

A origem das primeiras plantas chegadas à Ilha do Pico não é consensual. Se há quem diga que chegaram provenientes das ilhas do mediterrâneo, como a Sicília ou Creta, há também quem refute, afirmando que pelas características da vinha, o mais provável será terem vindo das Canárias, através da Ilha da Madeira. Diz-se que terá sido Frei Pedro Gigante quem terá plantado as primeiras vinhas na Ilha e até, que “Os muros de pedra existentes na Paisagem protegida, se alinhados, dariam duas voltas ao Equador.” São também estas incertezas, ou certezas difíceis de corroborar que alimentam um certo misticismo que parece habitar na Ilha, uma espécie de lugar do fantástico. 

As vinhas do Pico, são plantadas nas fendas abertas da rocha-mãe, em solo vulcânico e cercadas por muros de pedra solta, vulgarmente conhecidos como curraletas, como forma de estarem protegidas dos ventos salinos e criando assim um microclima. Visto de cima, o cenário é labiríntico, criando um impacto visual bastante forte, reforçado pela arquitectura tradicional e pelo próprio desenho da paisagem, fazendo das mesmas, roteiro obrigatório a quem visita a ilha. 

A paisagem vínica na Ilha do Pico é algo a que podemos chamar de fenómeno e não fosse a sua tão evidente singularidade, que em 2004 foi classificada Património da Humanidade pela UNESCO, constituindo hoje a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, uma área de paisagem protegida, onde o Lajido de Santa Luzia e o Lajido da Criação Velha aparecem como os lugares mais emblemáticos. Num cenário de montanha e vulcão, envolvido pela pacatez das gentes locais, esta paisagem de características únicas, lugar de força e obstinação, é o berço dos famosos vinhos do Pico. Este vinho de corpo licoroso, que chegou a constar de receitas médicas como cura para certos males, começou a tornar-se famoso no século XVII, sendo exportado para as Índias Ocidentais, Nova Inglaterra, Terra Nova e Rússia. A partir do século XVIII começa também a chegar à maioria dos países da Europa do Norte e também, a ser associado a algo luxuoso, tendo estado, inclusivamente, à mesa de Papas, o que lhe reforçou o seu passado já de si eclesiástico. Mas não só de Papas se conta a história do vinho do Pico, pois foi também à mesa de Czares Russos, que a sua fama se expandiu. 

Segundo reza a história, durante a Revolução Russa, terá sido encontrada uma garrafa de um vinho do Pico na cave do Czar Nicolau II. Apropriando-se deste fascinante detalhe histórico, nasceram os vinhos Czar, localizados na zona dos lajidos da Criação Velha, zona classificada pela UNESCO. Vencedor de variados prémios, dentre os quais, a medalha de ouro na feira internacional de Moscovo em 2011, os vinhos Czar já foram apelidados de fenómeno da natureza

Em meados do século XIX este lugar de força bruta, sofreu um forte abalo, devido às pragas vinícolas do oídio e da filoxera, que atingiram de forma dramática as vinhas. Este infortúnio altera de forma drástica, não só a a paisagem vinícola como a própria economia local, obrigando parte da população, à emigração. A doença das uvas traz com ela a morte de algumas castas e consequentemente, a introdução de novas, como forma de manter a produção, mesmo que de forma débil. Contudo, este momento de perda, não marcou de forma nenhuma o que viria a ser o futuro dos vinhos do Pico, acabando por demonstrar exatamente o contrário, a sua inquestionável força telúrica. Em 1949, a criação da Cooperativa da Ilha do Pico assume-se como um passo importante na sua história e acima de tudo, no seu futuro. Já no ano de 2014, com o estatuto de Património Mundial da Humanidade, da Paisagem Protegida de Interesse Regional da Cultura da Vinha na Ilha do Pico, surge um novo fôlego aos vinhos do Pico, impulsionando a aposta na produção vinícola de forma ainda mais viva. Já em 2018, a escolha do município de Madalena como “Cidade Portuguesa do Vinho 2018” trouxe os vinhos do Pico de volta à ribalta, potenciando a sua procura e o reconhecimento do seu valor por parte de um público cada vez mais alargado. 

Por tudo o que representa a história das vinhas do Pico, pela essência das suas gentes, pelo trabalho árduo e quase sobre humano que desde sempre lhes está associado, pela forte têmpera da própria ilha, os vinhos do Pico representam um valor inigualável. Este mosaico de pedra negra, em terrenos de natureza lávica e práticas culturais ancestrais, é o responsável por vinhos diferenciadores, vinhos salinos e minerais, vinhos de edição limitada. Pensar nos vinhos do Pico é pensar num tesouro cujo valor não se pode estimar e cuja preservação é chave. 

Se virmos as vinhas do Pico numa perspetiva aérea, o desenho é de tal forma impactante, pela estranheza das suas formas e pela própria irregularidade dos seus contornos rendilhados, que a sensação é a de poder estar ali uma mensagem encriptada, como se naquele bizarro mural, pudesse estar escondida uma história que aguarda ser contada e lançada ao Mundo. Talvez não de forma literal, mas num sentido puramente poético, essa visão seja mesmo verdade. Talvez os vinhos do Pico sejam ainda um segredo que chegará apenas aos ouvidos dos mais atentos, ou no caso, aos paladares mais refinados, que lhe saibam reconhecer a beleza de um lugar remoto, onde as pedras dão vinho.

 

No livro Guerra e Paz, Tolstoi fala no vinho do Pico e talvez este evento literário, de uma magnitude difícil de quantificar, seja a prova cabal da sua importância. Mas se apesar disso, dúvidas restarem, pensemos no facto de terem sido frades franciscanos a liderar o plantio da vinha, e aí a questão torna-se sagrada. Existe uma dureza indissociável às vinhas na Ilha do Pico, onde todos os trabalhos envolvem a força das mãos. As vinhas do Pico são filhas da volubilidade do clima, da impetuosidade do mar, da negrura da lava e da própria rudeza da pedra, e é dessa poderosa amálgama, que se escreve a sua história. 

A origem das primeiras plantas chegadas à Ilha do Pico não é consensual. Se há quem diga que chegaram provenientes das ilhas do mediterrâneo, como a Sicília ou Creta, há também quem refute, afirmando que pelas características da vinha, o mais provável será terem vindo das Canárias, através da Ilha da Madeira. Diz-se que terá sido Frei Pedro Gigante quem terá plantado as primeiras vinhas na Ilha e até, que “Os muros de pedra existentes na Paisagem protegida, se alinhados, dariam duas voltas ao Equador.” São também estas incertezas, ou certezas difíceis de corroborar que alimentam um certo misticismo que parece habitar na Ilha, uma espécie de lugar do fantástico. 

As vinhas do Pico, são plantadas nas fendas abertas da rocha-mãe, em solo vulcânico e cercadas por muros de pedra solta, vulgarmente conhecidos como curraletas, como forma de estarem protegidas dos ventos salinos e criando assim um microclima. Visto de cima, o cenário é labiríntico, criando um impacto visual bastante forte, reforçado pela arquitectura tradicional e pelo próprio desenho da paisagem, fazendo das mesmas, roteiro obrigatório a quem visita a ilha. 

A paisagem vínica na Ilha do Pico é algo a que podemos chamar de fenómeno e não fosse a sua tão evidente singularidade, que em 2004 foi classificada Património da Humanidade pela UNESCO, constituindo hoje a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, uma área de paisagem protegida, onde o Lajido de Santa Luzia e o Lajido da Criação Velha aparecem como os lugares mais emblemáticos. Num cenário de montanha e vulcão, envolvido pela pacatez das gentes locais, esta paisagem de características únicas, lugar de força e obstinação, é o berço dos famosos vinhos do Pico. Este vinho de corpo licoroso, que chegou a constar de receitas médicas como cura para certos males, começou a tornar-se famoso no século XVII, sendo exportado para as Índias Ocidentais, Nova Inglaterra, Terra Nova e Rússia. A partir do século XVIII começa também a chegar à maioria dos países da Europa do Norte e também, a ser associado a algo luxuoso, tendo estado, inclusivamente, à mesa de Papas, o que lhe reforçou o seu passado já de si eclesiástico. Mas não só de Papas se conta a história do vinho do Pico, pois foi também à mesa de Czares Russos, que a sua fama se expandiu. 

Segundo reza a história, durante a Revolução Russa, terá sido encontrada uma garrafa de um vinho do Pico na cave do Czar Nicolau II. Apropriando-se deste fascinante detalhe histórico, nasceram os vinhos Czar, localizados na zona dos lajidos da Criação Velha, zona classificada pela UNESCO. Vencedor de variados prémios, dentre os quais, a medalha de ouro na feira internacional de Moscovo em 2011, os vinhos Czar já foram apelidados de fenómeno da natureza

Em meados do século XIX este lugar de força bruta, sofreu um forte abalo, devido às pragas vinícolas do oídio e da filoxera, que atingiram de forma dramática as vinhas. Este infortúnio altera de forma drástica, não só a a paisagem vinícola como a própria economia local, obrigando parte da população, à emigração. A doença das uvas traz com ela a morte de algumas castas e consequentemente, a introdução de novas, como forma de manter a produção, mesmo que de forma débil. Contudo, este momento de perda, não marcou de forma nenhuma o que viria a ser o futuro dos vinhos do Pico, acabando por demonstrar exatamente o contrário, a sua inquestionável força telúrica. Em 1949, a criação da Cooperativa da Ilha do Pico assume-se como um passo importante na sua história e acima de tudo, no seu futuro. Já no ano de 2014, com o estatuto de Património Mundial da Humanidade, da Paisagem Protegida de Interesse Regional da Cultura da Vinha na Ilha do Pico, surge um novo fôlego aos vinhos do Pico, impulsionando a aposta na produção vinícola de forma ainda mais viva. Já em 2018, a escolha do município de Madalena como “Cidade Portuguesa do Vinho 2018” trouxe os vinhos do Pico de volta à ribalta, potenciando a sua procura e o reconhecimento do seu valor por parte de um público cada vez mais alargado. 

Por tudo o que representa a história das vinhas do Pico, pela essência das suas gentes, pelo trabalho árduo e quase sobre humano que desde sempre lhes está associado, pela forte têmpera da própria ilha, os vinhos do Pico representam um valor inigualável. Este mosaico de pedra negra, em terrenos de natureza lávica e práticas culturais ancestrais, é o responsável por vinhos diferenciadores, vinhos salinos e minerais, vinhos de edição limitada. Pensar nos vinhos do Pico é pensar num tesouro cujo valor não se pode estimar e cuja preservação é chave. 

Se virmos as vinhas do Pico numa perspetiva aérea, o desenho é de tal forma impactante, pela estranheza das suas formas e pela própria irregularidade dos seus contornos rendilhados, que a sensação é a de poder estar ali uma mensagem encriptada, como se naquele bizarro mural, pudesse estar escondida uma história que aguarda ser contada e lançada ao Mundo. Talvez não de forma literal, mas num sentido puramente poético, essa visão seja mesmo verdade. Talvez os vinhos do Pico sejam ainda um segredo que chegará apenas aos ouvidos dos mais atentos, ou no caso, aos paladares mais refinados, que lhe saibam reconhecer a beleza de um lugar remoto, onde as pedras dão vinho.

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