silves, uma cidade histórica que faz do algarve um lugar diferente
Existem lugares onde a chegada não significa o destino final. Lugares onde o chegar também implica de imediato partir. Pisar o chão de Silves pela primeira vez, é embarcar numa viagem no tempo e isso não é sinónimo de marasmo ou ausência de modernidade, muito pelo contrário. Silves é nos dias de hoje uma cidade viva, dinâmica e desperta para a atualidade dos novos tempos, o que verdadeiramente a distingue, é o facto de estar plantada num berço carregado de história. Uma das mais antigas cidades de Portugal, Silves, carrega elegantemente o peso de um passado de grande riqueza cultural e patrimonial, com traços de um forte romantismo, certamente deixados pela herança de um espaço que será perpetuamente de lembrança poética.
Pertencente ao distrito de Faro e localizada na região do Algarve, a sul de Portugal, Silves é uma cidade onde a presença humana remonta a tempos pré-históricos. Fortemente marcada e influenciada por quase cinco séculos de ocupação árabe, entre os séculos VIII e XIII, ficou conhecida como a “Bagdade do Ocidente” e também como, “berço da poesia arábico-andalusa”. Essa época de preponderância cultural, em que Silves era a cidade mais importante do ocidente da Península Ibérica, é ainda hoje sentida, não só através dos registos históricos, como da própria materialidade do seu desenho urbanístico, com destaque para o seu Castelo, revestido a arenito vermelho – o grés de Silves e uma das mais emblemáticas obras de arquitetura militar, deixadas pelos árabes neste território. Além do Castelo, existem variadíssimos outros pontos, que preservam essa memória enquanto repositórios desses outros tempos, como a Sé, a Cruz de Portugal, as Portas da Cidade, a Ponte Velha ou ainda, a Casa da Cultura Islâmica e Mediterrânica.
O concelho de Silves, um dos maiores da região do Algarve, está dividido em três grandes zonas naturais, o litoral, a serra e o barrocal. A Serra é a zona mais interior, com menor densidade populacional e com um relevo montanhoso, onde se destacam as charnecas e os montados. O barrocal, situa-se entre a serra e o litoral, com um relevo sinuoso, onde se cultivam as amendoeiras, figueiras, alfarroba, oliveira e citrinos, com grandes extensões agrícolas, sendo a zona com mais características mediterrânicas. Finalmente, a zona litoral, é aquela onde a transformação da presença humana é mais visível, sendo consequentemente também a mais povoada e aquela onde se encontram mais infraestruturas turísticas. Apesar disso, é também nesta zona, que a atividade piscatória se mantêm economicamente relevante, e onde ainda se pode encontrar a tipicidade das fainas de pesca. A ligação entre três zonas tão distintas e a variedade que a elas associada, faz deste território um lugar de uma extraordinária riqueza natural e paisagística.
Além desse património histórico que é tão simbólico e tão presente em Silves, e também dessa diversidade natural que de alguma forma completa e lhe dá características únicas, existem ainda, outros elementos que engrandecem este lugar, e que hoje são marcas que lhe estão imediatamente associadas. Uma delas é incontornável, a laranja. Decorria o ano de 2016, quando o Município de Silves decide criar a marca “Silves: Capital da Laranja”. A ligação entre Portugal e a laranja remonta ao século XVI, quando a mesma foi introduzida na Europa por mercadores portugueses, sendo que consequentemente, acabariam até por ser denominadas de “portuguesas” em vários países. Neste sentido, a criação desta marca vem não só assumir o que já era uma ligação muito evidente desta região com este fruto, mas acima de tudo do concelho de Silves em particular, potenciando uma maior notoriedade deste produto e um reconhecimento do seu carácter e identidade tão singulares. A criação da “Rota da Laranja” no início deste ano de 2020, foi de alguma forma, o elemento que faltava a essa valorização, estabelecendo-se assim uma oferta turística, que permite aos visitantes conhecer e experienciar por dentro, todos os processos, desde a sua produção, à sua transformação, até ao consumo final.
Nesta área da gastronomia, a história de Silves não se escreve apenas através dessa conexão com o mundo dos citrinos. É num passado mais recente, que também no universo dos vinhos, este território se começa a destacar e a crescer. É neste concelho, que dentro da região do Algarve, se encontra o maior número de produtores de vinho. Os vinhos de Silves, já assim conhecidos, têm vindo a ser amplamente aclamados em concursos internacionais, e por consequência, a sua afirmação em mercados dentro e fora de Portugal têm-lhes permitido assumir uma posição de considerável destaque. Além de os podermos ficar a conhecer nos restaurantes desta região, acompanhados pelos melhores pratos que esta gastronomia nos oferece, como o xarem, ou as as cataplanas do litoral, prováveis descendentes da tajine marroquina,é hoje também possível, usufruir de outro tipo de experiências, como provas de degustação, que derivam do aparecimento de variados projetos ligados ao enoturismo.
Um dos eventos indissociáveis da cidade de Silves, onde de alguma forma todos os elementos mencionados anteriormente se relacionam, complementados por espetáculos de música, dança, poesia ou animação de rua, é a Feira Medieval. Enquanto forte marca de turismo cultural, a Feira Medieval, traz até Silves, milhares de visitantes todos os anos. A decorrer desde 1996, todos os anos pelo mês de Agosto, este é hoje um evento icónico, que não só permite preservar essa herança histórica, como partilhá-la de uma forma diferente, mais criativa e participativa. Uma das mais valias deste tipo de iniciativas, é a forma original e consequentemente, mais apelativa, como acabam por também contribuir para uma transmissão de conhecimentos e saberes.
Por todas estas razões, conhecer Silves nos dias de hoje, vai não só permitir aos visitantes, uma imersão na sua profunda densidade histórica e patrimonial, como também, o encontro com Silves na sua contemporaneidade. Esta relação entre passado, presente e futuro não é obviamente simples, e em muitos territórios estabelecida de forma menos cuidada, prejudicando a experiência da visita. Em Silves, acontece o inverso, ou seja, a ligação entre estes três momentos, com toda a complexidade que lhes está associada, acontece aqui de forma fluída e acima de tudo, harmoniosa. Se de um lado temos a exuberância do legado árabe e o vermelho grés das muralhas do Castelo, de outro temos a beleza única dos laranjais em tons de verde e laranja. Se podemos ficar encantados com as casas pitorescas, cercadas por alfarrobeiras e amendoeiras, podemos também usufruir de uma praia internacional. E tudo isto, sem esquecer as vastas extensões de serra, e um contacto privilegiado com a natureza, nas suas mais diversas facetas. A grandeza de Silves, é assim o resultado dessa contaminação, não só do passado, com a passagem de diferentes religiões, culturas e civilizações, como também, da sua essência presente, onde muita dessa sua sumptuosidade não se perdeu, apenas se metamorfoseou.
Julho 2020
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