castelo de soure
Soure é uma vila portuguesa do distrito de Coimbra, que se situa na Beira Litoral, região Centro do país. Soure encontra-se perfeitamente embrenhado nos braços da Serra de Sicó, elevação composta por um maciço calcário que apresenta uma grande variedade de diferentes formas cársicas. Embora esta vila se situe a poucos quilómetros de duas grandes cidades como a Figueira da Foz e Coimbra, existe um forte desconhecimento sobre ela, não existindo sequer qualquer tipo de ideia generalizada ou pré concebida sobre este lugar. Contudo, a ausência de um imaginário que envolva esta vila não é um factor negativo, nem uma característica que lhe confira menor importância ou interesse. A página em branco é apenas um incentivo à exploração, onde neste caso, a descoberta pode ser surpreendente.
Quando pensamos num Castelo, existem dois pensamentos chave, que se materializam de forma imediata e inconsciente, a primeira prende-se com a ideia de fortaleza, e a segunda com o desenho de algo que se situa numa parte mais elevada, num topo, num lugar de destaque que permite que a sua observação seja iminente de qualquer outro ponto. Este “Castelo de Muro” foi erguido numa zona plana, numa colina baixa formada por aluviões, o que imediatamente conta uma história diferente e talvez aí, nessa estranha forma de ser, que se assume contrária à da maioria, se encontre o cerne da genuinidade do Castelo de Soure.
A construção numa zona plana – o que não acontecia na maioria dos castelos medievais – terá certamente tido em questão, a confluência dos Rios Anços e Arunca, como forma de garantir o controlo fluvial. A ausência de informações documentais e testemunhos escritos, faz com que a historia da construção deste castelo, esteja envolta nalgum misticismo e evidente especulação. Um dos pontos de consenso, será o motivo da construção, como forma de organizar a defesa de Coimbra das investidas muçulmanas, formando a linha avançada de proteção de Coimbra, juntamente com os restantes Castelos da Rede, dentro os quais, o de Penela, Lousã ou o de Montemor-o-Velho.
Reforçando mais uma vez que a história do Castelo de Soure se encontra sob uma névoa de incertezas, existem elementos coincidentes que nos fazem crer na possível veracidade dessas descrições. Aparentemente, terá sido o Conde S. Sesnando Davides, o responsável pela sua construção, a quem, D. Fernando I, o Magno, terá entregue o governo da vasta região a sul do Douro, após a conquista de Coimbra em 1064. A construção foi inicialmente feita com base numa estrutura bastante simples, denotando-se uma certa rudez, como se tivesse ocorrido às pressas, recorrendo apenas a materiais que estariam disponíveis.
Pelo ano de 1111, o Conde D. Henrique e a D. Teresa, terão outorgado foral a Soure, estabelecendo assim o concelho e a regulação da sua administração, deveres e privilégios. Como forma de atrair e fixar população numa zona claramente de fronteira, onde a insegurança era permanente, eram atribuídos privilégios socais e fiscais. Apenas quatro anos depois, corria o ano de 1116, a ocorrência de uma investida almorávida obrigou toda a população a abandonar a vila.
O que se vai tornando evidente, enquanto tentamos mergulhar nos fragmentos de história do Castelo de Soure é o quão atribulada foi, sofrendo constantes mutações e passando de mão em mão. Nesse sentido não é pois de estranhar que num diferente capítulo da sua vida, o Castelo tenha sido doado à Ordem do Templo, pela condessa D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques. A localização do Castelo, em torno de uma via de acesso ao Norte, uma estrada romana que ligava Olissipo (Lisboa) a Bracara Augusta (Braga), dotou-o de uma forte importância estratégica, já que esta estrada medieval, era uma das mais usadas, tanto para as incursões muçulmanas, como para as cristãs.
A estrutura inicialmente simples do Castelo, foi evoluindo ao longo dos tempos, sendo que um dos responsáveis por uma das suas mais importantes fases, terá sido D. Gualdim Pais, mestre da Ordem do Templo. D. Gualdim mandou erguer duas torres quadrangulares, e uma torre de menagem com base rampeada, cuja inovação, demonstrava já, a sua vasta experiência. Em 1319, durante o reinado de D. Dinis, o Castelo de Soure passa a ser parte do domínio da recém fundada Ordem de Cristo, uma milícia que viria herdar os bens da já extinta Ordem dos Templários.
O passar do tempo trouxe a degradação e a inevitabilidade da intempérie do esquecimento. A partir do século XIX, as duas torres do Castelo, são vendidas por João Ramos Faria a João Lobo Santiago de Gouveia, Conde de Verride e, em 1880, o estado de ruína obriga a Câmara a dinamitar a torre sudoeste, de forma a conseguir evitar a sua derrocada. Durante o século XX, este monumento viria ainda a pertencer ao poeta Santiago Presado e só em 2004, o Município de Soure conseguiria finalmente adquiri-lo.
O Castelo de Soure é um raro exemplo da arquitectura militar proto-românica em Portugal, que foi predominantemente utilizado enquanto alcáçova, ou seja, enquanto residência soberana. Para os que hoje o visitam, o exercício de imaginar o que terão sido as suas dinâmicas no passado e a forma como se foi metamorfoseando, torna-se bastante complexo. Uma coisa é certa, a localização do Castelo de Soure é tão peculiar e tão distante da nossa construção visual de um castelo, pelo simples facto de estar numa zona plana, faz com que o primeiro encontro seja sempre surpreendente, inesperado. De forma não propositada, este lugar assume uma proximidade não habitual entre o dia a dia e as rotinas das pessoas normais, com o imaginário histórico, de reis e de rainhas, de derrotas e de conquistas e de guerras e de batalhas.
O Castelo de Soure é o lugar certo para a fabulação de histórias, porque o que começa por ser uma certa estranheza pela sua invulgar situação geográfica – que pode ser de alguma forma agravada pela sua decadência também já bastante notória – rapidamente se torna no seu sinal mais atrativo. A experiência de conhecer o Castelo de Soure é daquelas em que o chegar e o partir são dois momentos completamente distantes e distintos e só por isso, já deveria assumir carácter obrigatório.